quarta-feira, 14 de maio de 2008

Relativizar o que?




Haja relativismo cultural para aceitar esta imagem

Que tal relativizar a categoria cultura ao invés do que esta categoria, muitas vezes de forma tão confusa, chama de cultura e enxerga em suas práticas ditas culturais?

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Senhora dos Afogados - Os Nomes

Os nomes representam outro aspecto importante em “Senhora dos Afogados”.
Vejamos:
Moema, a “sobrevivente”, que tem como resultado ter que viver somente em companhia da morte, significa exausta, desfalecida, a que faz encerrar o dia. Sua trajetória é efetivamente fatigante: uma trajetória maquiavélica de mortes sucessivas em nome de um amor incestuoso, que, quando realizado, tem como par um cadáver (do pai). Curioso também que quase todos os personagens na montagem de Antunes usam preto, inclusive ela, no início. Ao final, com seu projeto realizado, ela é a única de branco, todos os outros estão de preto. Ela fez noite do dia de todos para que seu dia fosse possível...mas seu dia será um dia sombrio, sem luz...sua imagem sequer se reflete no espelho;
Misael, o pai desejado pela filha, que matou uma prostituta há 19 anos e a mulher no tempo presente, significa quem é Deus? Muito interessante o nome representar uma pergunta que não é exatamente a negação de Deus, mas seu desconhecimento. Importante lembrar que ele tem um alto cargo na justiça e justifica plena e serenamente os dois assasinatos. As leis são as dele...não de Deus....é ele quem dá a vida (é o pai dos quatro filhos) e tira a vida também (mata as duas genitoras);
Família Drummond: muito curiosa a opção de Nelson Rodrigues. Bem sabemos que na maioria dos textos de Nelson, nomes e sobrenomes são comuns, cotidianos, populares. São Almeidas, Mendonças, Farias, Gonçanves...e normalmente de origem portuguesa, independente da classe social.
Copio abaixo, texto que encontrei no site do Observatório da Imprensa, extraído do Dossiê Drummond, de Geneton Moraes Neto. A fala é do próprio Carlos Drummond de Andrade:

"Nelson Rodrigues não morria de simpatias por mim. Toda vez que fazia uma peça de teatro ele punha um incesto ou coisa assim. Naquele tempo, o incesto no Brasil era um pecado terrível. A censura logo metia o pau em cima dele. Ele apelava para o Prudente de Moraes Neto, apelava não sei se a Antonio Callado, a
Manuel Bandeira, a mim. E sempre protestávamos contra 'aquele absurdo da censura' etc. Um dia, ele fez uma peça e me convidou a assistir. Havia um parto em cena, uma mulher gemendo no escuro. Achei aquilo de muito mau gosto. E, na saída, ele encarregou um repórter da Última Hora de me entrevistar. Eu não quis dizer que não tinha gostado da peça, porque era desagradável para ele. Nélson era muito suscetível. Ele não gostou disso. A partir de então, passou a me atacar no Correio da Manhã. Diariamente, ele fazia um artigo em que me metia o pau e me atribuía frases idiotas que nunca pronunciei. Achei o seguinte: ele poderia ser um grande escritor, mas, em matéria de caráter, não era dos mais perfeitos. Nelson Rodrigues resolveu, então, botar numa peça de teatro uma família Drummond que era uma família toda de criminosos, incestuosos, tarados e homossexuais. Uma coisa terrível! Antes, essa família chamava-se Vanderley. Mas havia um Vanderley desses pernambucanos mais perigosos que mandou dizer a ele: se ele botasse o nome Vanderley na peça, levaria um tiro. Como ele estava com raiva de mim - uma raiva que durou anos e nunca fiz nada contra ele; apenas, não quis falar mal da peça em público -, botou o nome Drummond em lugar de Vanderley... Resolvi não tomar conhecimento. (....) Percebi também que a malandragem de Nelson Rodrigues era esta: se eu protestasse, aí então é que a peça ficaria mais interessante ainda, porque criava-se uma polêmica. E ele adorava polêmica!"

(In O Dossiê Drummond, Geneton Moraes Neto, São Paulo,
Editora Globo, 1994, págs. 43/4.)

Não sei se era exatamente da polêmica que Nelson gostava.....mas que seu intuito era denunciar de forma explícita e não deixar a falsa moral em pé, isso era....sobrou até para o Drummond....pois é....no caminho tem sempre uma pedra...

domingo, 4 de maio de 2008

Senhora dos Afogados - A Trama

Neste último sábado (04/05) fui no Sesc Vila Nova assistir ao espetáculo “Senhora dos Afogados”, texto de Nelson Rodrigues, montagem do grupo Macunaíma e direção de Antunes Filho.
Como de costume no caso deste trio, um espetáculo competente. Cenografia, figurino, direção e em particular a técnica dos atores deixam o público realmente satisfeito e com a sensação de que “valeu à pena”, de que ninguém saiu do espetáculo do mesmo jeito que entrou.
Existe uma muita coisa a respeito deste espetáculo. No final dos anos 40, quando lançado por Nelson Rodrigues, escandalizou público e crítica, custando depois décadas de censura.
E por que a censura?
O espetáculo denuncia, expõe e ridiculariza o mais tradicional modelo familiar-burguês da época: o da família “de nome”, com suas posses, seus títulos e seus valores inexpugnáveis.
A família em questão chama-se Drummond. Vive em uma região portuária...sempre tendo à frente o mar. Esta família aristocrática digna-se de há 300 anos não cometer um adultério sequer, de zelar pelos valores, por submeter os desejos.
Isso não é sinal de paz familiar ou ao menos sanidade familiar, ao contrário. Moema, a protagonista, é uma das filhas do casal Misael e Eduarda e tem um desejo definitivo: o pai.
Em nome desse desejo traça um plano e destitui de humanidade todos os personagens que a cercam, usando-os ou matando-os para que sobrem somente ela e seu objeto de desejo.
Para isso elimina todas as mulheres da casa, afogando as outras duas irmãs (as preferidas do pai), a avó esclerosada (morta por inanição) e mãe, morta pelo próprio pai, deixada morta na praia, sangrando, com as duas mãos cortadas.
Essa vingança do pai é resposta ao adultério de Eduarda, que o traiu com o noivo de Moema. Na verdade Eduarda e Misael são vítimas de um plano de Moema que só se torna noiva para atrair o noivo-marinheiro para casa parq eue ele seduza a própria mãe. Ele por sua vez, tinha seus motivos: era filho ilegítimo de Misael com uma prostituta que ele mesmo havia matado há 19 anos, no dia de seu casamento com Eduarda.
De trama em trama Moema vai eliminando a todos e como resultado tem todos eliminados da velha e tradicional família: sobrando apenas ela e o pai, embora este na condição de cadáver, o último a morrer, do coração, ao perceber que as mãos de Moema são exatamente idênticas às de Eduarda, que havia mutilado, justamente por ser esta a parte do corpo, para ele, mais autônoma em qualquer ato de adultério.